Disponibilização: Segunda-feira, 31 de Janeiro de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano IV - Edição 882
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576.01.2009.064731-1/000000-000 - nº ordem 2782/2009 - Declaratória (em geral) - MARCIO ELIZANDRO ESPURIO X
EMBRATEL S/A - Processo nº 2782/2009 3ª Vara Cível V I S T O S. MÁRCIO ELIZANDRO ESPURIO propôs AÇÃO
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO c.c. pedido de tutela antecipada c.c. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
contra EMBRATEL S/A, alegando, em síntese, ter passado por constrangimento ao tentar efetuar compras no comércio da
cidade, quando, surpreso, recebeu a notícia de que seu nome constava dos cadastros de inadimplentes. Constatou, em seguida,
que essa inscrição deu-se por ordem e conta da requerida, por suposta habilitação de linha telefônica em seu nome, o que não
corresponde à realidade, porquanto jamais adquiriu tais direitos da requerida. Essa conduta acarretou dissabores e transtornos
passíveis de indenização por danos morais a ser judicialmente fixada, pretendendo ainda, a declaração de inexistência de
relação jurídica entre as partes com o consequente cancelamento das restrições em nome do requerente, bem como a
inexigibilidade da dívida. O pedido de tutela antecipada foi deferido (fls.15). Regularmente citada, a requerida ofertou contestação
(fls. 33/45) aduzindo, em resumo, que a habilitação deu-se em nome do requerente, passando de boa-fé a emitir as faturas
diante da efetiva prestação dos serviços. Agiu no exercício regular de seu direito em enviar o nome do requerente aos órgãos de
proteção ao crédito, pois havia débito em seu nome. Possíveis fraudadores habilitaram a linha telefônica em nome do autor, não
podendo a requerida ser responsabilizada por danos que não foram por ela ocasionados. A indenização, assim, é indevida,
diante da inexistência de culpa de sua parte, atribuída a fato de terceiro. Houve réplica. É O RELATÓRIO. D E C I D O. O feito
comporta julgamento antecipado, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, por envolver matéria
estritamente de direito, sendo certo que os fatos estão documentalmente comprovados. Sustenta a requerida ter sido acionada
a prestar os serviços ao requerente, e desde então, de boa-fé, passou a prestar os serviços, logo se viu no direito de emitir as
respectivas faturas em nome do requerente. No entanto, não teve o cuidado de juntar com sua contestação documento
comprobatório dessa assertiva, a despeito de não estar obrigada a comprovar fato negativo. Nesse particular, a hipossuficiência
técnica reconhecida pelo código consumerista depõe a favor do autor, nos termos do artigo 6.º, VIII. A chamada inversão do
ônus da prova, no Código de Defesa do Consumidor, está no contexto da facilitação da defesa dos direitos do consumidor,
ficando subordinada ao “critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras
ordinárias de experiências” (artigo 6°, VIII). Ela depende de circunstâncias concretas que serão apuradas pelo juiz no contexto
da facilitação da defesa dos direitos do consumidor. A hipossuficiência, no caso vertente, é técnica e decorre da dificuldade ou
até mesmo da impossibilidade do autor em identificar a origem da habilitação da linha. É bem possível que os documentos
pessoais do autor tenham sido utilizados como instrumentos para a concretização do negócio jurídico que ensejou a emissão de
faturas. Tenho adotado o posicionamento de que a operadora não deveria ser responsabilizada pelos danos eventualmente
acarretados ao usuário-consumidor, diante da existência de fato de terceiro que afastaria, em tese, essa responsabilidade de
indenizar. No entanto, após refletir sobre a questão, estou alterando esse posicionamento para admitir essa possibilidade
indenizatória diante dos transtornos acarretados ao usuário/consumidor diante da evidente falha na prestação dos serviços de
telefonia. Assim sendo, além da presença dos requisitos legais para a declaração de inexistência de relação jurídica entre as
partes no que diz respeito à dívida propriamente dita também se encontram presentes os requisitos para a pretendida
indenização. De fato. Se a empresa de telefonia não exige formalização do contrato, trata-se de risco inerente a sua atividade.
E ainda, se a contratação feita de forma simplificada se dá pelo mero repasse de informações ao atendente, por telefone,
assume ela o risco pela operacionalização, não podendo alegar pura e simplesmente o fato de terceiro como excludente dessa
responsabilidade. Diz o artigo 5º, inciso X, da Constituição da República, que são invioláveis, a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. O
inciso XXXII remete ao legislador ordinário a proteção do consumidor, o que veio por intermédio da Lei nº 8.078/90, prevendo no
artigo 6º, inciso VI, a reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos. Não resta dúvida que as
empresas fornecedoras de produtos e serviços, de uma forma geral, devem precaver-se o quanto possível para evitar danos ao
consumidor ou a terceiros. Destarte, a parte vulnerável na relação de consumo está protegida pela legislação específica, que
adotou como direitos básicos aqueles de “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos
e difusos”, admitido, por outro lado, o princípio da inversão do ônus da prova também em prol do consumidor. No caso vertente,
o autor aponta como fato constitutivo de seu direito a atitude da requerida em levar o seu nome a registro nos Cadastros do
Serviço de Proteção ao Crédito, o que lhe causou transtornos e constrangimentos, além de lhe ter sido impedido de efetuar
compra parcelada em estabelecimento comercial. Tratando-se de relação de consumo, o caso é disciplinado pelos princípios e
normas de ordem pública e interesse social constante no Código do Consumidor, os quais exigem do fornecedor a diligência e
cuidados necessários na execução de seus serviços, a fim de prevenir a ocorrência de danos ao consumidor (art. 6.º, VI, Lei n.
8078/90). A tese de que a habilitação tenha sido fruto da prática de ato ilícito por terceiros não se sustenta nem serve de
excludente, como já mencionado. Antes de habilitar a linha a operadora deveria acautelar-se quanto aos riscos da atividade,
conferir adequadamente os dados do solicitante. A facilidade na busca de novos clientes nesse concorrido mercado pode
acarretar, como acarretou, dissabores àquele que teve seu bom nome atingido por máculas de mal pagador ou inadimplente. Em
casos que tais, deve ter-se em vista a culpa aquiliana estampada nas disposições do artigo 186 do Código Civil. Segundo a
melhor doutrina, alguns elementos são indispensáveis para tanto: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência; b) dano patrimonial e moral; e, c) nexo de causalidade entre a conduta do
agente e o dano, requisitos presentes na conduta da requerida. Não se pode perder de vista, ainda, as regras do artigo 927,
parágrafo único, do Código Civil, instituindo a responsabilidade objetiva em razão da atividade normalmente desenvolvida e
inerente aos riscos. Havendo acidente de consumo impõe-se o dever indenizatório. No caso, ao contrário do que sustenta a
requerida, sua atuação não foi tão diligente como sugere. Não se discute a faculdade que tem a concessionária de remeter o
nome do devedor aos cadastros dos órgãos protetores do crédito ou cobrar o usuário inadimplente. Mas esse direito fica
condicionado à comprovação da efetiva inadimplência. A conduta utilizada, sem dúvida, caracterizou abuso desse direito. Essa
omissão quanto ao dever que lhe é imposto no exercício de sua atividade, sem dúvida, caracteriza falta e a consequente
responsabilidade de indenizar o autor pelos danos experimentados. O nexo causal entre essa conduta e o resultado lesivo é
evidente. CARLOS ROBERTO GONÇALVES, em sua obra Responsabilidade Civil, 5ª Ed, pág. 31, assinala que “para que se
configure a responsabilidade por omissão é necessário que exista o dever jurídico de praticar determinado fato (de não se
omitir) e que se demonstre que, com a sua prática, o dano poderia ter sido evitado”. Nesse sentido, em casos análogos já se
decidiu: “EMENTA - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - Procedência - Inscrição do nome do autor em cadastros de proteção
ao crédito por suposto débito referente à habilitação de linha telefônica em seu nome por terceira pessoa - Responsabilidade
civil extracontratual, ante a inexistência de relação contratual entre as partes - Recurso, por conta disso, conhecido - Patente a
negligência, representada pela falta de cautela da requerida ao proceder a habilitação de linha telefônica em nome do autor sem
verificar a autenticidade dos documentos apresentados ou comprovação de que a solicitação tenha partido efetivamente do
requerente e não por terceiro fraudador - Abalo demonstrado pela injustificada negativação - Dano moral que é imediato e
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